Operação memória 10 de Junho

Fonte: Pintada na parede do Liceu Rainha Dona Leonor [A Rua, Junho de 1977]


Entre 1975 e 1980 as direitas portuguesas, com destaque particular para o Movimento Nacionalista, mobilizaram-se para restaurar as celebrações do dia 10 de Junho, num clima tenso de manifestações e confrontos de rua violentos.


Com o intuito de escrever um artigo científico dedicado especificadamente a esta campanha reivindicativa, peço a todos os que participaram naquelas mobilizações ou que tenham delas algum registo, de me contactar enviando os seus testemunhos.


Procuro todo o género de informação acerca dessas mobilizações, nomeadamente:

  • Percurso pessoal de aproximação ao meio nacionalista e grau de envolvimento na mobilização do 10 de Junho
  • Clima político e social envolvente o movimento nacionalista em geral nos anos 1975-1980 e em particular nas celebrações do 10 de Junho
  • Estruturação das organizações nacionalistas envolvidas na mobilização do 10 de Junho
  • Considerações pessoais acerca da campanha de mobilização do 10 de Junho
  • Sugestões acerca dos elementos importantes a analisar na reconstrução da mobilização do 10 de Junho


Aguardo as vossas memórias.

Riccardo

Menção Honrosa do Prémio Fundação Mário Soares [17-12-2010]

A Tese de Doutoramento que deu origem aos dois livros "Folhas Ultras" e "Império Nação Revolução" foi distinguida com a "Menção Honrosa" do Prémio Fundação Mário Soares.


A Conferência no Diabo [07-12-2010]

Um relato da Conferência foi publicado por Duarte Branquinho - a quem agradeço a atenção - na edição de O Diabo de 7 de Dezembro de 2010.

Debater as direitas
Decorreu nos passados dias 29 e 30 de Novembro, no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, um seminário intitulado “As raízes profundas não gelam? Ideias e percursos das direitas portuguesas” organizado pelo investigador Riccardo Marchi. Este italiano radicado em Portugal é autor de um estudo sério sobre as direitas radicais portuguesas de 1939 a 1974, o que era uma lacuna na nossa historiografia. Marchi decidiu investigar aprofundadamente o assunto e doutorou-se em História no ISCTE com a tese que deu origem a dois livros complementares: “Folhas Ultras. As ideias da direita radical portuguesa (1939-1950)”, publicado pelo ICS, tem por base a primeira parte do seu estudo; “Império, Nação, Revolução. As direitas radicais portuguesas no fim do Estado Novo (1959-1974)”, publicado pela Texto, é a parte central da sua tese.

Razões de um seminário
Numa entrevista ao blogue Dissidente.info, questionado sobre as razões que o levaram a organizar este seminário, Marchi respondeu: “Quis reunir peritos de cada área específica das direitas que permitam desenhar um “fil rouge” desde o miguelismo contra-revolucionário até ao liberalismo dos nossos dias. Como é óbvio, não procuro uma lógica unívoca que conecte coerentemente tudo o que se moveu na direita em Portugal nos últimos 200 anos. Procuro sim identificar quais raízes afundam no terreno das ideias das direitas portuguesas e, a partir desta pluralidade, pretendo desvendar quais frutos produziram, se ainda são fecundas ou se, pelo contrário, secaram de vez. O intuito final dos dois dias será produzir uma colectânea com as contribuições dos oradores e de outros autores”.

Dois dias de trabalhos
Coube ao Rui Ramos a abertura do seminário com a comunicação “As direitas na historiografia portuguesa” e a introdução não podia ter sido melhor. Há muito que este historiador tem denunciado uma oposição que se faz entre a esquerda e direita como se se tratasse do “bem” e do “mal”, perdoando-se os “excessos” das esquerdas e recriminando o mínimo deslize das direitas. Tal reflecte-se no campo historiográfico onde não devia acontecer. Segundo Rui Ramos, há uma cultura instalada que leva a que mesmo historiadores que não seguem necessariamente uma agenda política caiam nessas simplificações. Dos vários exemplos que deu, lembro aqui um: a chamada “ditadura de João Franco” é sempre considerada uma ditadura, por outro lado, o Governo Provisório de 1910, tecnicamente ma ditadura, nunca recebe essa designação e as suas medidas persecutórias são “compreendidas”.
Seguiram-se duas intervenções sobre o miguelismo “A reacção anti-liberal miguelista” de Maria Alexandre Lousada, e “A violência política no miguelismo” de Fátima Sá. Como se pode adivinhar pelos títulos das comunicações, estas centraram-se no “terror miguelista” que recordava, a espaços, as palavras iniciais de Rui Ramos.
Na tarde do primeiro dia falou José Manuel Quintas, sobre o “Integralismo Lusitano para além das etiquetas” e foi bastante interessante ouvir as origens desta experiência política e intelectual portuguesa por tantas vezes (propositadamente) mal tratada. O único defeito da sua comunicação foi a falta de tempo para assistir a tudo o que estava preparado. Seguiu-se a excelente intervenção de Ernesto Castro Leal, intitulada “As direitas revolucionárias na I República”, que se centrou em grupos menos conhecidos como a Acção Realista Portuguesa ou o Centro do Nacionalismo Lusitano, falando com clareza e demonstrando profundo conhecimento.
No segundo dia, duas intervenções a que O Diabo assistiu. Primeiro do cronista Henrique raposo que falou sobre “A Direita liberal no Portugal do Século XXI”, tentando demarcar o liberalismo do puramente económico, ao mesmo tempo que adiantou que várias das suas ideias, tão criticadas, estão a ser propostas pela própria União Europeia a vários estados devido à actual crise. Depois a comunicação de José Pedro Zúquete, “O Império contra-ataca: uma ideia antiga para as direitas do futuro”, que era sem dúvida a que tinha o melhor título de todo o seminário e prometia debate.

Ideias para o futuro
A José Pedro Zúquete, investigador a quem coube o primeiro artigo académico sobre o Partido Nacional Renovador (PNR), há que reconhecer a capacidade de estudo da chamada “extrema-direita”, em todas as suas complexidades, e a coragem de tentar propostas para o futuro, recusando a aposição confortável de observador não-interveniente.
Na sua participação neste seminário lembrou a importância da lusofonia na construção das direitas do futuro. Essa era a “ideia antiga” a que se referia o título da sua comunicação. Criticou o PNR por não a considerar, desejando boa sorte a quem tentar pesquisar o termo “lusofonia” no site deste partido nacionalista. Louvando, por outro lado, o Movimento Internacional Lusófono (MIL), disse que este era a expressão de uma ideia que não devemos desprezar.

A Conferência no Incentivo dos Açores [06-12-2010]

Um relato da Confêrencia foi publicado por Flávio Gonçalves - que aproveito para agradecer - no diário dos Açores, Incentivo, na edição de 6 de Dezembro de 2010.


Movimento Vanguardista - acerca de uma fotografia [10-12-2010]

Uma corecção do Vítor Luís acerca de uma fotografia do Movimento Vanguardista publicada no livro Império Nação, Revolução.

Aqui vai a imagem que publicaste, mas com data de «1969».
Na realidade foi em Julho de 1970, o mês da morte de Salazar. Aliás, ele faleceu salvo erro, num Domingo, precisamente quando estávamos lá, nesse Curso em Tróia. O dr. Adriano Moreira, um dos oradores convidados, mudou rapidamente o tema da sua intervenção, a propósito, que passou a ser sobre Salazar e o Poder Carismático.
Esta «Tróia» é exactamente a da península frente a Setúbal e a «Caldeira» era uma pequena baía interior, do lado esquerdo da península, não muito distante da zona turística, então ocupada pelos primeiros empreendimentos da Torralta nessa zona. O «Palácio Sottomayor» era tão só um grande «casarão» antigo, construído frente ao rio Sado, numa das pontas da «Caldeira».

Jovem Europa [09-12-2010]

Mais um interessante testemunho por parte de um antigo militante de Jovem Europa.

Cerca de 1965 tive notícias dum Movimento Político dirigido por um belga – Jean Thiriart – o Jovem Europa. Aproximei-me daquele, mas tive sempre dificuldade em entender com nitidez o seu objectivo essencial.

Era de Direita, mas apresentava-se como sendo duma Direita especial, inovadora. Mas parecia-me que tinha qualquer coisa de Poujadismo. Afirmava-se profundamente europeu, o que me agradava. Quanto ao Poujadismo, este pareceu-me sempre inconsistente e populista, portanto destinado a desaparecer em pouco tempo. Um epifenómeno. Já não se estava no período de Entre Guerras! Mesmo com esta convicção permaneci no Jovem Europa. Participei na fundação da Revista da Organização em Portugal, chamada Europa; que não viu a luz do dia, tanto quanto sei [na verdade Europa saiu em número único no ano de 1968 n.d.r.] . Os obstáculos da Censura foram muitos.

Recordo-me bem das minhas conversas com o número dois dos Serviços de Censura de Lisboa, o velho tenente Jorge de Carvalho, penso que um antigo Sidonista, que como autoridade policial teve intervenção no caso célebre do Angola e Metrópole. Aquelas conversas foram o processo de dizer não às nossas intenções.

Abandonei o Jovem Europa quando me apercebi que se pretendia organizar uma milícia.

Eu já tinha lido e relido A Técnica do Golpe de Estado de Malaparte; e, além do mais, tinha na altura sido um dos signatários do Manifesto dos 101. Assim não deveria continuar ligado ao Jovem Europa. Seria incoerente.

O meu relacionamento com a Organização deveu-se inicialmente parecer-me ser esta capaz de ajudar a diminuir o marasmo político, social e económico em que o País vivia. Aqui permaneci também dada a presença de um colega, Armando Costa e Silva, a que me ligavam laços de Cultura, e que foi um dos principais pensadores da Extrema-direita, embora não tivesse escrito quase nada sobre este assunto. Debatemos em longas conversas muitos problemas do tempo.

As raizes profundas não gelam? [2º dia de trabalhos]

O 2º dia de trabalhos foi dedicado às Direitas no Segundo pós-guerra e na Democracia.


Os trabalhos do primeiro painel foram abertos por Bruno Cardoso Reis (ICS), com uma comunicação sobre "Os católicos no segundo pós-guerra", com referência também à formação católica de António de Oliveira Salazar e as suas relações políticas com a Igreja.


Seguiu-se a comunicação de Luís Aguiar Santos sobre "Os monárquicos no secundo pós-guerra" e a de Riccardo Marchi (ICS) sobre o "Nacionalismo revolucionário na crise do Império".
A moderação do painel esteve a cargo de Goffredo Adinolfi (CIES-ISCTE)


O painel da tarde sobre as Direitas na Democracia portuguesa foi moderado por Pedro Lomba (EUI)


Os trabalhos do painel foram abertos por José Pedro Zúquete (ICS-UL), com uma comunicação sobre a Lusofonia com o título sugestivo "O império contra-ataca. Uma ideia antiga para as direitas do futuro".


Seguiu-se a comunicação de Henrique Raposo sobre "A Direita Liberal no Portugal do Século XXI" centrada na experiência do grupo reunido na revista Atlântico.


Finalmente, os trabalhos foram concluidos pela comunicação de Jaime Nogueira Pinto (ISCPS-UTL) sobre as diferenças entre "Direitas e Nova Direita no Portugal democrático"


Jaime Nogueira Pinto responde às perguntas do público.


Os dois dias de conferência terminaram com um debate aceso, as vezes polémico, que deu bem a ideia de como um tema ainda tão pouco estudado desperte profundas divergências de opinião ao passo que nos aproximamos aos nossos dias.

As raizes profundas não gelam? [1º dia de trabalhos]

O início dos trabalhos, com a moderação da Professora Fátima Bonifácio (ICS-UL) e a comunicação introdutória do Professor Rui Ramos (ICS-UL) sobre “As direitas na historiografia portuguesa”.


O Professor Rui Ramos responde às perguntas do público


As Professoras Fátima Sá (1ª a direita) do CEHC-IUL e Maria Alexandre Lousada (FL-UL) animaram o primeiro painel sobre contra-revolução, com as comunicações "A violencia política no miguelismo" e "A reacção anti-liberal miguelista do século XIX" respectivamente.


O Professor Armando Malheiro da Silva (FLUP) abre os trabalhos do segundo painel, moderado pelo Professor António Costa Pinto (ICS-UL), com a comunicação "As direitas da república e do sidonismo".


O Professor José Manuel Quintas (Academia da Força Aérea) apresenta a comunicação "Integralismo Lusitano para além das etiquetas".


O Professor Ernesto Castro Leal (FL-UL) fala das "Direitas revolucionárias na Primeira república", com enfoque no movimento da Acção Realita Portuguesa.


Os trabalhos viram a participação de um público atento, não só académico, que animou os debates das duas secções de dia 29 de Novembro, evidenciando as diferentes interpretações que podem surgir acerca de um mesmo fenónemo.

Hóspede de um Dissidente [25-11-2010]

Reproduzo aqui a entrevista publicada no blog Dissidente e aproveito para agradecer o convite que me foi feito pelos seus animadores.




1. O que te levou a organizar este Seminário sobre as ideias e percursos das direitas portuguesas?


Quando há cinco anos atrás comecei a interessar-me de direitas portuguesas nas minhas investigações de doutoramento sobre as “direitas radicais”, procurei em primeiro lugar um instrumento bibliográfico que me proporcionasse uma panorâmica do tema geral na qual poder colocar, do ponto de vista histórico e ideológico, o tema específico das minhas investigações. Procurei e não encontrei. Ou seja, havia uma falha na bibliografia portuguesa. Essa ocupou-se (e ocupa-se) de períodos e acontecimentos históricos determinados ligados a esta ou aquela direita, mas nunca procurou (que eu saiba) desenhar uma genealogia de conjunto desta família política, pelo menos desde a formalização histórica das etiquetas de “direita” e “esquerda”. Desde então fiquei com a vontade de resolver este estímulo intelectual, mas ao longo dos anos de doutoramento e nos primeiros de pós-doutoramento nunca tive a oportunidade de o fazer. Finalmente decidi-me e fi-lo, por enquanto, em forma de conferência. Estou a trabalhar na organização pelo menos desde Fevereiro, pois quis reunir peritos de cada área específica das direitas que permitam desenhar um fil rouge desde o miguelismo contra-revolucionário até ao liberalismo dos nossos dias. Como é óbvio, não procuro uma lógica unívoca que conecte coerentemente tudo o que se moveu na direita em Portugal nos últimos 200 anos. Procuro sim identificar quais raízes afundam no terreno das ideias das direitas portuguesas e, a partir desta pluralidade, pretendo desvendar quais frutos produziram, se ainda são fecundas ou se, pelo contrário, secaram de vez. O intuito final dos dois dias será produzir uma colectânea com as contribuições dos oradores e de outros autores: uma fonte para os apaixonados de pensamento politico e principalmente um instrumento de orientação para jovens investigadores que se queiram debruçar sobre estes temas.

2. O que distingue actualmente uma pessoa de Direita?

Pergunta de um milhão de dólares! Digo já que não vou responder à tua pergunta, mas aproveito para fazer algumas considerações.
Não posso responder porque, em primeiro lugar, não existe “uma pessoa de direita” visto não existir “uma direita” mas “muitas direitas”. Faço-te apenas quatro exemplos retirados da actualidade para sublinhar a impossibilidade de definir de forma unívoca “uma pessoa de direita”.
Em relação ao Estado, há direitas que apelam à centralidade do Estado entendido como comunidade politicamente organizada, mas há também direitas que advogam o Estado mínimo em nome da defesa e primazia do indivíduo face à comunidade.
Em relação à cidadania, há direitas que defendem uma visão contratualista da sociedade e portanto a inclusão nela de todos os que trabalhem, paguem os impostos e respeitem as leis. Mas há também direitas que reclamam (consciente ou inconscientemente) uma visão imperial (não confundir com “imperialista”) e entendem que a nação é uma comunidade de destino na qual se devem poder integrar todos os que acreditam e se comprometem neste caminho comum independentemente das suas origens. Há finalmente direitas que consideram esta comunidade exclusiva dos que partilham determinadas origens étnicas e culturais e portanto excludentes dos elementos alógenos nos seus direitos de cidadania.
Em relação aos chamados “direitos civis”, há direitas que defendem o princípio da laicidade e do respeito e reconhecimento legal da livre escolha do indivíduo em matérias sensíveis como a orientação sexual e a bioética; e há direitas que, em defesa deste mesmo princípio de laicidade, apelam à restrição de comportamentos individuais que consideram ostensivos e ofensivos da mesma laicidade, como por exemplo certos hábitos religiosos. Há finalmente direitas que julgam certas expressões de laicismo como extremistas e atentatórias dos costumes, tradições, valores dominantes da comunidade, apelando, por exemplo, à defesa do modelo de família tradicional e ao direito à vida.
Em relação à geopolítica, há direitas que se sentem parte integrante de um modelo (o Ocidental) caracterizado por uma estrutura económica (liberal-capitalista) e por um sistema político (democracia) bem determinado, representado pelo eixo Estados Unidos–Europa-Israel, mas há também direitas que consideram o Ocidente não uma pátria comum ameaçada, mas sim uma área de dominação político-económico-militar norte-americana em fase de expansão contínua em detrimento de outros povos e civilizações (inclusive a europeia).
À luz destas rápidas considerações (muitas outras poderiam ser feitas), torna-se mais fácil perceber a impossibilidade de definir o que distingue actualmente uma pessoa de direita. Pode-se dizer que uma pessoa é de direita quando apresenta um pendor estatalista, anti-ocidentalista, integracionista. Mas também quando apresenta um cariz liberista, ocidentalista, laicista e assimilacionista. E também quando se demonstra anti-europeista, “welfare-chauvinist” e tradicionalista. Enfim, podemos teorizar (e encontrar na realidade do dia a dia) qualquer mistura destes “ismos”; misturas que afastam algumas “direitas” de outras “direitas” ao passo que as aproximam desta ou daquelas “esquerdas”. Por esta razão, o exercício melhor não é perguntar a uma pessoa “você é de direita?”, mas sim “você o que acha acerca de…?”. Exercício que, diga-se de passagem, ajuda a evitar companhias indesejadas e assumidas apressadamente em nome apenas de etiquetas banalizadoras.

3. Existe realmente uma Direita em Portugal? Depois de 1974 passou a ser quase um crime ser de Direita e mesmo no hemiciclo o partido que se senta mais à direita diz pertencer ao Centro.

Atenção: também o Estado Novo nunca se definiu um regime de direita, pois achava perigoso e anti-nacional oficializar uma dicotomia que acabaria por dividir a unidade orgânica da nação que o regime tanto prezava. Certa hipocrisia da linguagem política é transversal a todos os regimes, qualquer seja a sua orientação e tipologia.
Em relação ao pós-25 de Abril, estava mesmo a comentar alguns dias atrás com um colega como seja engraçado o facto que todos os partidos portugueses à direita do espectro político tiveram a necessidade de incluir a denominação “democrático” no seu nome: Partido Social Democrata, Centro Democrático Português ao passo que nenhum partido de esquerda teve que fazer isso apesar de 2 em 3 (BE e PCP) estarem abertamente contra o modelo de “democracia ocidental” em vigor praticamente desde a fundação do regime democrático português. Há, como é óbvio, razões históricas sobejamente conhecidas que explicam este fenómeno, que, para além disso, não é uma exclusiva da relativamente jovem democracia portuguesa. A história da direita parlamentar do meu país (Itália) é feita de 50 anos de fuga ao rótulo “de direita” por parte das suas expressões moderadas (Partito Liberale) e de utilizo do termo “direita” por parte do partido herdeiro do Fascismo (Movimento Sociale Italiano) principalmente para evitar o rótulo oficial de “fascista”. Mais, o MSI, após ter representado por 50 anos, ininterruptamente e no parlamento, 2 milhões (4%) de eleitores fascistas, acabou com definir-se anti-fascista uma vez alcançado o poder em meados dos anos 90. Se é compreensível abandonar o rótulo de “fascista” uma vez que se passa a representar já não 4% mas 13% do eleitorado, definir-se “anti-fascista” apesar da própria história é pelo menos de mau gosto.
Esta comparação Itália-Portugal serve para sublinhar que organismos como os partidos, supostamente representantes máximos das liberdades políticas dos cidadãos, estejam há décadas reféns de condicionalismos históricos e de “ditaduras intelectuais” do politicamente correcto, contribuindo assim a desvirtuar aqueles mesmos princípios básicos que afirmam defender.
Felizmente a história das ideias (enfoque da conferência de 29-30 de Novembro) deve preocupar-se em descrever e explicar estes fenómenos sem procurar nenhum consenso eleitoral, razão pela qual posso deixar estas pruderie terminológicas aos competidores eleitorais.
Dito isto, a conferência não tem nenhum objectivo de legitimação do termo “direita”, pelo menos nas intenções do seu organizador…ou seja, eu. Francamente, do ponto de vista das ideias, nunca consegui raciocinar em termos de “legitimidade” ou “ilegitimidade”. Por outro lado, do ponto de vista da acção política, a legitimidade não a considero uma dádiva, mas uma conquista.

4. As diferenças entre Esquerda e Direita tenderão a diluir-se no futuro?

Depende do que entendem por “Esquerda” e “Direita”. Se falam dos partidos mainstream, sem dúvida as diferenças vão diluindo-se. Este é um processo já em curso há algumas décadas e acompanhou a agonia das ideologias. Para além disso, hoje em dia os decisores políticos nacionais estão cada vez mais dependentes de condicionalismos supranacionais de diferentes níveis (desde a União Europeia, à Aliança Atlântica, à ONU, etc.) em quase todas as áreas antigamente exclusivas da soberania nacional. Por essa razão os partidos que pretendam realisticamente aceder ao poder sabem a partida que têm que acatar com princípios, perspectivas, regras, normas, compartilhadas nestes patamares supranacionais. E fazem-no sem grandes dificuldades. São socializados politicamente nestes princípios e, nos cada vez mais raros casos em que não acedam à “alta política” já compartilhando estes princípios, a aproximação às esferas do poder habitua-os rapidamente a este esbatimento das diferenças.
Não se trata todavia de uma inevitabilidade finalística. Felizmente com o sistema demo-liberal não chegámos ao fim da história nem ao melhor dos mundos possíveis, razão pela qual o homem continuará a elaborar ideias políticas e a sonhar e realizar sistemas de convivência. Estas elaborações e realizações vivem amiúde acelerações repentinas devidas a momentos de crise ou oportunidades inesperadas, o que me leva a pensar que poder-se-ão criar novas dicotomias ou, melhor, novos cenários plurais refractários à convergência “catch-all” que caracteriza os nossos dias. Estes novos cenários possivelmente não se desenharão nas antigas dicotomias direita/esquerda, mas em novas sínteses, contaminações, encontros, definições: a história está cheia destas nascenças.

5. Há futuro para a Direita em Portugal?

Esta já não é pergunta da 1 milhão de dólares mas de cartomante de feira. Estou a brincar e aceito o vosso desafio. Bom, depende a que futuro e a que direita se referem. Se falam das direitas (centro) parlamentares nada leva a crer que nos próximos anos deixem de alimentar a alternância bipartidária de governo, consolidada em Portugal desde o 25 de Abril. Se se referem às direitas extra-parlamentares – partidos ou movimentos, liberais ou radicais – nada leva a crer que possam sair da marginalidade na qual sobrevivem desde a sua fundação. Se se referem às direitas intelectuais (em todas as suas vertentes) nada leva a crer que estejam, não digo empenhadas, mas nem sequer interessadas em experimentar novas sínteses nem em jogar batalhas culturais de uma qualquer envergadura. Limitam-se e limitar-se-ão a reproduzir ideias de respeitáveis mas antigas (ou velhas?) direitas sem desafiar substancialmente o status quo das ideias já há muito estabelecidas. Para parafrasear Nietzsche, não me parece que nas direitas haja muito caos interior que permita predizer o parir de uma estrela que dança. Mas, como disse antes, a história sofre acelerações repentinas geradoras de caos e estrelas. Até lá, deixo-vos a vós julgar se e quão radioso será o futuro da direita em Portugal: cada um com os seus gostos.

6. Muito obrigado pela entrevista e boa sorte na organização do seminário. Queres deixar alguma mensagem final?

Nenhuma “mensagem final”. Só um “convite inicial”: quem puder apareça nos dias 29 e 30 de Novembro. O debate animado pelo público é o que valoriza os resultados das conferências, principalmente em temas onde há ainda muito trabalho para fazer. E obrigado pela entrevista.