John Andrade [23-08-2010] - II

Mais umas valiosas memórias de John Andrade acerca da Legião Portuguesa.

Sobre a Legião Portuguesa: a partir do momento em que Marcello Caetano subiu ao poder, a LP, que estava em decadência, começou a reorganizar-se, aceitando antigos combatentes do Ultramar (em especial Comandos e Rangers) e alguns voluntários estrangeiros para construir uma frente de oposição a Marcello, que já há anos era considerado de pouca confiança; e Marcello sabia disto, de tal modo que tentou acabar com a LP, mas sem o conseguir. Por outro lado, o Serviço de Informação da LP tinha à frente um holandês, o Engenheiro Gijsbert Andringa, que se suspeitava que fosse Marcellista e tinha uma filha comunista, a Diana Andringa; e o subchefe era o Major Antunes, pai do famoso Melo Antunes, bem conhecido por ligações à esquerda activa e com ficha na PIDE. Em resumo, o SI estava infiltrado indirectamente, e ainda por cima estava sob a vigilância da PIDE, por ordem directa de Marcello.

Alguns Comandos Distritais da LP eram pouco activos, o que levou a facção nacionalista revolucionária a tomar iniciativas que os Comandantes, geralmente oficiais do Exército, desconheciam. Acontecia também que essa facção da LP tinha o apoio da 2ª Repartição (Informações) do Exército. Chegou-se ao ponto de haver uma rivalidade aberta entre a LP e a PIDE para ver quem enviava ao Governo as melhores informações com maior rapidez. E embora a PIDE tivesse uma rede estabelecida de informadores, a LP tinha informações de melhor qualidade; ainda me lembro de ter lido vários PERINTREPS e SITREPS, que realmente estavam feitos com profissionalismo.

No quartel general da LP, na Penha de França, havia antes do 25 de Abril uma colecção extraordinária de relatórios de agentes secretos do tempo da 2ª guerra mundial. O Governo português era neutro, a Inglaterra era a "velha aliada", mas havia muita gente a favor do Eixo. Lisboa era, naqueles anos, uma cidade onde se encontrava um espião em cada canto. A PVDE (antecessora da PIDE) vigiava os agentes alemães e italianos. E a LP simpatizava com eles e trocava informações – e de que maneira; tráfego marítimo, por exemplo. Estava tudo naquelas pastas. Infelizmente, parece que, na altura do 25 de Abril, foi tudo destruído ou deitado para o lixo. Uma perda inestimável.

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