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Conversando com um Leitor [30-10-2010]

Apresento uma interessante troca de impressões que tive com um leitor dos livros "Folhas Ultras" e "Império, Nação, Revolução".
As Perguntas/considerações do Leitor serão indicada em itálico e com o acrónimo CF, as minhas respotas com o acrónimo RM.

CF: Gostei muito dos seus dois livros sobre a história da direita radical em Portugal. Creio que esses livros representam um contributo valioso para a historiografia nacional e que o facto de serem escritos por um estrangeiro ainda mais valoriza esse contributo.
Dito isto, gostaria de fazer alguns comentários sobre esses livros, apesar de a minha formação académica não ser na área da história.
No que toca ao livro Folhas Ultras, parece-me que ele peca por uma ausência de contextualização do percurso de Alfredo Pimenta. Julgo que teria sido interessante fazer um resumo do percurso anterior de Alfredo Pimenta bem como do estado em que estava a direita radical em 1939, quando começa a guerra, tendo em conta o resultado da agitação nacional-sindicalista de uns anos antes. Por exemplo, qual a relação, se é que havia alguma, entre os nacional-sindicalistas e Rolão Preto, de um lado, e Alfredo Pimenta, do outro, quer antes de 1939, quer depois desse ano? Qual a relação de Alfredo Pimenta com os expoentes do Integralismo Lusitano durante as décadas de 1930 e 1940? Alguns destes assuntos são aflorados brevemente no livro mas eu creio que todo o contexto em que se move Alfredo Pimenta e a direita radical poderia estar mais bem retratado no livro. Só assim se poderia perceber, por exemplo, a evolução ideológica de Rolão Preto que começa por estar à direita de Salazar e acaba à sua esquerda, a apoiar a oposição democrática.

RM: muito obrigado pela sua e-mail. Agrada-me saber que encontrou nos meus dois livros uma leitura interessante.
O Senhor afirma que o livro "Folhas Ultras" peca por uma ausência de contextualização do percurso de Alfredo Pimenta (situação da direita radical antes de 1939 e relação com Rolão Preto e Integralismo Lusitano). De facto você tem razão. "Folhas Ultras" surge como parte introdutória aos meus estudos sobre a direita radical portuguesa nos anos 60-70, mas desenvolveu-se de tal maneira (pense aos achados sobre o percurso do jornal "A Nação" e o grupo de jovens de "Mensagem") que apesar de não representar uma obra exaustiva sobre direita radical antes dos anos 60, mereceu uma publicação autónoma, devido também à diferença organizativa e doutrinária da direita radical dos anos 40/50 (reunida à volta de Pimenta) relativamente à dos anos 60. Inicialmente não era minha intenção abordar o pensamento de Alfredo Pimenta, querendo eu dedicar-me às organizações da direita radical mais que aos pensadores individuais, mas acolhi (com muito gosto e proveito) a sugestão do Professor António José de Brito que aconselhou-me vivamente de abordar o pensamento político de Alfredo Pimenta como alicerce da militância intelectual de toda a geração radical dos anos 40-50. Certo é que - como você diz - a relação de Pimenta com os Integralistas e com Rolão Preto nos anos 30-40 teria sido muito interessante e indicativa das fracturas que se viveram na direita radical e que se desenvolveram nos anos a seguir, mas quando se escreve um trabalho histórico é preciso fazer escolhas: focalizar certos argumentos e deixar apenas "aflorar" outros deixando-os na mesa como pistas para futuras investigações.

CF: Também gostaria de perceber porque é que o período escolhido começa em 1939 quando a maior dinâmica da direita radical em Portugal sucede uns anos antes, nomeadamente com o movimento nacional-sindicalista, na primeira metade da década de 1930.

RM: A razão pela qual decidi escolher o ano de 1939 como começo dos meus estudos, deixando de lado o nacional-sindicalismo, reside no facto que o meu objectivo era sondar as origens da direita radical intransigentemente adepta do fascismo e do nacional-socialismo como base de partida para estudar os movimentos que após 1945 permaneceram fiéis aos "derrotados da Guerra". E estas origens encontram-se na altura do eclodir da II Guerra Mundial quando uma parte consistente (talvez a mais consistente) do nacionalismo radical português decide permanecer fiel à antiga aliança com a democracia Inglesa e apoiar nessa perspectiva o neutralismo de Salazar. É a partir de 1939 que se estrutura uma frente rigidamente pró-Eixo à volta do jornal Esfera e de Alfredo Pimenta que se manterá activa também depois de 1945: nestas origens do meio pró-Eixo, o nacional-sindicalismo como organização estruturada (inclusive no seu líder Rolão Preto) teve pouca influência e não apenas por ter sido dissolvido 5 anos antes do começo da Guerra.

CF: Disse numa entrevista que estava a trabalhar num estudo que abordava a direita radical no período democrático. Gostaria de saber se tenciona abordar fenómenos mais recentes como sejam a fundação do PNR.
Finalmente, gostaria de saber a sua opinião sobre a seguinte tese. É opinião comum que aquilo que no actual regime democrático impede a direita radical de ultrapassar a sua situação de marginalidade política é a memória ainda bastante viva do regime autoritário do Estado Novo. Isto porque seria natural que no presente contexto de dificuldades económicas e problemas sociais pudesse emergir à direita um partido com o mesmo êxito político que o BE teve à esquerda. Gostaria de saber se concorda com essa tese, especialmente tendo em conta que no seu país, a Itália, a memória do regime de Mussolini (que arrastou o país para uma guerra, coisa que não aconteceu em Portugal) não impediu o MSI, no pós-guerra, de ter representação parlamentar durante décadas e, inclusive, um seu dirigente de chegar a vice-primeiro-ministro.

RM: Em relação aos meus estudos actuais, a resposta é sim: estou analisando todo o período democrático desde 25 de Abril de 1974 até aos nossos dias, inclusive o PNR sobre o qual apresentei já algumas comunicações em congressos nacionais e internacionais e escrevi um artigo que deverá ser publicado numa revista italiana. Acerca deste partido ou da área a volta dele e da possibilidade de reproduzir, na extrema-direita, o percurso eleitoral do BE, posso dar-lhe uma opinião como cientista político, pois não sou futurologista e (graças a deus) não trabalho com bolas de cristal. O que outros países europeus nos mostram é que partidos de direita radical têm possibilidades de vincar nos tempos actuais de crise económico-social, mas só se tiverem uma identidade alheia às experiencias autoritárias da primeira metade do Século XX. Como você justamente referiu, na Itália conseguiu emergir e resistir um partido de clara inspiração Mussoliniana como o MSI, mas estávamos em 1946 quando apesar da derrota, a "cultura política" do eleitorado ainda mantinha certas referências ideológicas (fascismo/comunismo/etc.). Quando, nos anos 90, se deu a crise italiana de "mãos limpas" e a passagem da primeira à segunda república, o MSI teve a oportunidade de capitalizar em termos de votos esta crise, mas para o fazer (e conseguiu faze-lo) teve que abandonar progressivamente a sua identidade fascista (já a muito fossilizada e estéril), aproximando-se de uma identidade liberal-conservadora com matizes claramente anti-fascistas. Quem representa com sucesso certas posições de extrema-direita na Itália hoje (apesar de não se definir tal) é a Lega Nord, um partido populista e regionalista que cresce no húmus da crise económico-social mas que se apresenta abertamente como partido anti-fascista e demoliberal. O mesmo se passa com os partidos populistas e de extrema-direita do norte-Europa: todos anti-fascistas e ocidentalistas (daí o apoio a Israel, a islamophobia, etc.). A mesma Frente Nacional francesa, que por primeira represnetou uma força de extrema-direita com sucesso consolidado, sempre reivindicou o seu cariz "não fascista" (nunca se definiu anti-fascista que eu saiba), ou seja a componente fascista interna sempre foi mantida à margem da identidade oficial do partido que se refazia muito mais ao nacional-populismo poujadista (de onde vinha Le Pen). E de facto onde Le Pen encontrou grandes dificuldades (assim como Haider) foi frente às acusações de "fascismo" (o Holocausto como detalhe da História; certo pangermanismo austríaco saudosista do Reich, etc.). Em fim, parece-me que a possibilidade do emergir de um partido nacional-populista e de extrema-direita até possa existir em Portugal, mas não de matriz salazarista (penso por exemplo ao que aconteceria se Alberto João Jardim decidisse fundar um partido nacional "anti-sistema" centrado na sua liderança carismática...na minha opinião teria bons resultados). Dito isso, acho também que em Portugal possa ter êxito um partido populista com um discurso anti-elitista (contra a classe política), anti-corrupção e anti-partitocrático. Pelo contrário, duvido muito que o discurso anti-islâmico e anti-imigração tenha algum resultado a nível nacional, devido às características sociais de Portugal (trata-se de saber escolher a agenda política).

Comentário de Xavier Casals [08-04-2010]

Após a entrevista publicada no seu blog, o historiador espanhol Xavier Casals enviou-nos um comentário que publico com todo o gosto, pelo interessante cariz comparativo que oferece às futuras investigações sobre as direitas radicais ibéricas.

Los dos estudios de Marchi -Folhas Ultras e Impèrio, Nação , Revolução- permiten hacerse una buena idea de la evolución de la extrema derecha portuguesa desde los años cuarenta hasta el fin del Estado Novo en 1974. Como investigador de la ultraderecha española, su lectura me ha parecido interesante porque me ha permititido establecer unas primeras visiones comparativas entre la ultraderecha española y la lusitana y comprobar que sus trayectorias tienen más en común que de diferente.

En primer lugar, porque ambas obras dejan claro que la ultraderecha portuguesa constituye una suerte de aliada-enemiga de la dictadura, al igual que sucedió con la extrema derecha española en la España de Franco. En segundo lugar, porque explican las razones por las cuales tras el fin de la dictadura este espectro político fue incapaz de crear dejar una fuerza con representación permanente en el parlamento, como pasó en España después de la muerte de Franco. En tercer lugar, proque presentó dos polos urbanos -Coimbra y Lisboa- de gran similitud con los de Barcelona y Madrid en términos de centros importadores y creadores de ideología: en este sentido, Barcelona, como Coimbra, siempre ha sido más "modernizador". Por último, porque permite constatar que la descolonización no generó un movimiento ultranacionalista, como en España (a diferencia de Francia).

En definitiva, los trabajos de Marchi llenan un vacío académico para quienes investigamos la extrema derecha y me han permitido corroborar una hipótesis que sostenía: que la evolución de las extremas derechas del Midi europeo -Portugal, España y Grecia- es muy semejante y su larga ausencia de los parlamentos ha sido debida -en buena medida- a la existencia de dictaduras nacionalistas. En este aspecto, sus estudios acaban con tópicos de "excepcionalidades" españolas o portuguesas por lo que respecta a este espectro político al mostrar trayectorias parecidas en ambos países.

Comentários...do outro lado da barricada

Na minha opinião, o livro de Riccardo Marchi – independentemente das cores ou trompetas da capa, que não têm qualquer importância face ao conteúdo – é excelente. Em primeiro lugar, como investigador em matéria de história contemporânea, reconheço-lhe o mérito duma pesquisa notável. Ficou muito por dizer….certo, a história não existe é uma construção do espírito que como um andaime tenta aproximar-se da realidade de que se ocupa o historiador. Claro que me estou inspirando em Wittgenstein. Em segundo lugar, razões quase sentimentais me despertaram outro tipo de interesse pelo livro. Refere a minha época de estudante, quando então me situava num campo bem diverso. Anti-hegeliano, sempre manifestei alergias intelectuais a “doutrinas” da esquerda profunda ou da direita bacoca. Em terceiro lugar, admirei a permanente fuga a clichés ou lugares comuns.

Interesso-me por temas afins e foi-me de grande utilidade académica.

JD

Críticas gráficas...mas não só

Recebo e publico um comentário precioso, vindo de uma fonte que foi indispensavel para a redacção do livro todo, especialmente para o parágrafo sobre o Movimento Nacionalista (pp.360-371)

Como a capa do livro, penso que este blogue tem vermelho e 'cornetas' a mais... Essa «interpretação» bacoca, própria da vulgaridade editorial, de algo que foi modernista e realmente «verde», presente na cor das camisas e na cruz de Avis, poderia ter sido aqui corrigida. Um trabalho impecável do ponto de vista técnico mas que sofre de uma conceptualização deficiente, a meu ver. É o blogue do livro - só? - ou um blogue da missão prospectiva do Riccardo, ligado também, e muito, ao trabalho presente e futuro de prospecção e levantamento histórico?
Poderia então ter sido tratado de forma independente do tema e do grafismo peculiar seleccionado pela editora para a capa deste primeiro livro.
VL

Vítor,
o
brigado pelos teus comentários “cromáticos” sempre preciosos, porque vêm de um artista ao mesmo tempo protagonista das histórias narradas. Como sabes concordo em pleno com as “cornetas a mais”. Eu também acho que os meninos da Mocidade não retratam fielmente o meio descrito no livro, feito mais de experiências com uma certa heterodoxia e autonomia face às organizações oficiais do regime. A verdade é que quisemos manter o mais possível a coerência com a veste gráfica do livro, apesar de o blogue ser independente face à operação editorial. Já sobre o “vermelho a mais”…concordo menos. A cor vermelha chama a paixão juvenil (ideológica e de combate) e acho que acompanha bem o tema do livro. Não sei se o verde desperta o mesmo impacto visual.
Já a
gora, aproveito a tua provocação das “cornetas a mais” para lançar um debate acerca das relações entre o nacionalismo radical português e o regime, que sempre despertaram o meu interesse. Apesar de ter falado bastante com os protagonistas acerca disso, acho que muito deve ainda ser dito e contado. Quem sabe que este blogue seja uma boa oportunidade para o confronto.

Manlius [05-01-2010]

Já li atentamente o livro de Riccardo Marchi. Não me parece nada mal, antes pelo contrário. Teve boas fontes (nalguns casos aponta uma fonte quando a informação proveio de outra, mas tudo bem). Fez trabalho de casa, e intenso.
É omisso nalguns períodos principalmente nos poucos meses que antecederam o 25 do 4 e a preparação dos nacionalistas para o que estava para acontecer. Também se calhar ninguém esteve na disposição de lhe revelar os detalhes. Está muito ligado ao pós 25 e às lutas que se seguiram. A coisas que a maior parte dos intervenientes acha que ainda é cedo para contar. Enfim, há muitas pessoas vivas e em situação insuspeita. E etc...
Também é bastante omisso nas lutas sociais e sindicais do Jovem Portugal. Mais uma vez culpa nossa.
Li também com prazer o artigo de Jaime Nogueira Pinto no Jornal I. […] É um artigo que veio de um camisa vieja (da altura, claro). Do fundador da célula do Jovem Portugal no Liceu D. Manuel II, no Porto, e do militante activo no período descrito. Algumas vantagens teve o Jaime. Não rachou no pós 25, quando outros, como Lucas Pires declaravam alto e bom som terem sido sempre democratas... E etc. que não estou para dizer muito mais. […] A sua afirmação sobre a presença da nossa gente na luta pós 25 do 4 foi determinante. Aliás preparada desde Outubro de 1973. Só que o MFA sem o saber - ou melhor sem perceber a dinâmica - abarbatou - no meio da sua loucura de prisões a metro - muita gente importante. Mas não foi por causa disso que não houve um combate sério. E se não fossem umas pessoas que eu cá sei o resultado teria sido muito diferente. Aliás o livro Capitão de Abril, Capitão de Novembro do Cap. Castro explica muitas coisas. Mas a vida é o que é e não o que poderia ter sido.
De todas as maneiras estou a coligir todos os pequenos detalhes com os quais ou discordo ou mesmo que podem ter esclarecimentos adicionais. E prometo que os vou escrever aqui neste espaço.


Comentários:

1) […] Por acaso, terminei hoje a leitura do «Império, Nação, Revolução». É um livro espectacular, especialmente para alguém como eu, que desconhecia grande parte da "história das direitas radicais". Tudo o que sabia eram peças soltas que apanhava aqui e ali e procurava juntar. Através do livro pude reunir muitas pontas soltas, fazer algumas descobertas surpreendentes e obter um retrato global da evolução desta área política. MV

2) Este livro vem finalmente preencher uma lacuna. Foi realmente preciso um "alien", como lhe chama JNP, para fazer um trabalho isento. Ainda bem. Sigam-se outros. DB

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