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make war with love - 1970

Um antigo militante da Cidadela de Coimbra deu-me, anos atrás, o autocolante “Make War With Love” (Foto) que os militantes nacional-revolucionários costumavam colar nos seus carros nos primeiros anos 70. Na altura achei engraçado o slogan, apesar de não ter dado muita importância ao documento.

Assim, chamou-me a atenção um artigo do Diário de Lisboa de Outubro de 1975 que encontrei há uns dias e que evidencia como aquele slogan não era fruto da fantasia de uns estudantes nacionalistas, mas algo mais interessante. Nunca
tinha ouvido falar da central de contra-informação que gerou o slogan, razão pela qual reproduzo por inteiro o texto dos dois artigos do Diário de Lisboa, alertando para a parcialidade do jornal em 1975, mas deixando assim pistas por quem queira aprofundar ou, tendo já informações, corrigir e explicar.




Lembram-se do “slogan”?

C.D.I.: Make War With Love.

Ten-coronel Ferreira da Cunha era um dos responsáveis.

Fonte: Diário de Lisboa, 28.10.1975, pp.1-2


Sob o título Marcelo Caetano criou uma super-pide? Está «O Século» a publicar uma série de artigos em que se diz que «sob a sigla C.D.I. (Centro de Documentação Internacional) funcionou durante o regime de Marcelo Caetano, e a seu pedido, um organismo encarregado de, a nível nacional, coordenar com vistas à guerra psicológica todos os dados e informações fornecidas pela P.I.D.E./D.G.S., Legião Portuguesa e outras estruturas do fascismo».

O nosso confrade descreve, em seguida, a formação desse Centro e nomeia alguns dos seus responsáveis. Podemos acrescentar, contudo, alguns detalhes à descrição e alguns nomes à lista desses responsáveis. Sobretudo, um, o mais importantes, justamente pelas funções que actualmente exerce: o tenete-coronel José Luís Ferreira da Cunha, secretário de Estado da Informação!

Em princípios de 1970, e sob a designação de Comissão interministerial de acção psicológica (C.I.), que propositadamente nada elucida, foi constituído um grupo destinado a estudar e a propor soluções em função de uma linha de preocupação expressa por sua excelência o presidente do Conselho, em reunião do Conselho Superior de Defesa Nacional: necessidade de esclarecimento, propaganda e acção psicológica, frisando:

- o prestigio das Forças Armadas, da ordem e das instituições;

- a política de defesa do Ultramar». (De um relatório de PEREIRA DE CARVALHO, directorados Serviços de Informação da ex-PIDE/DGS, ao ministro do Interior).

Por proposta do CLEMENTE ROGEIRO, aprovada por MARCELO CAETANO, em 6 de Março de 1971, a C.I. passou a integrar os seguintes elementos:

Presidente: CLEMENTE ROGEIRO, depois GERALDES CARDOSO, em representação da Presidência do Conselho,

Delegados de: Defesa Nacional: Brig. Sacadura Moreira da Câmara, depois brig. Castro Ascensão;

Ministério do Interior: Parente de Figueiredo, pela L.P.; Pereira de Carvalho, pela PIDE/DGS; Ministério do Ultramar: Fialho Ponce; Ministério dos Negócios Estrangeiros: Bonifácio de Miranda; Ministério da Educação Nacional: Teixeira de Matos, que só assistiu a uma reunião, depois José Manuel de Sousa; Secretaria de Estado da Informação e Turismo: Luís Oliveira e Castro; Ministério das Corporações: Bigote Chorão, depois Joaquim Videira; Acção Nacional Popular: não chegou a indicar delegado;

A funcionar em colaboração com o C.I., estava uma outra Comissão, Comissão Orientadora de Contrapropaganda Radiofónica (C.O.R.), criada em 11 de Setembro de 1967, competindo-lhe o empastelamento das emissões do estrangeiro.

Pela proposta referida em 2, o C.D.I. tornou-se o Órgão técnico da Comissão Interministerial (O.T./C.I.).

O O.T./C.I. era constituído do seguinte modo:

José Manuel de Sousa, director; tem. Cor. José Luís Ferreira da Cunha; cap. Frag. Adriano Coutinho Lanhoso (em 1972 acumulava com o cargo de adjunto militar de Marcelo Caetano) e maj. Augusto Azevedo Batalha; Pereira de Carvalho (director dos serv. Inf., da PIDE/Dgs).

Estes elementos apoiavam-se em toda a estrutura do C.D.I. nomeadamente numa equipa constituída predominantemente por militares do Q.G.

Não vamos agora nomear todas as actividades deste grupo, citando apenas, entre elas, a elaboração dos diferentes tipos de relatórios de informações (RAREP, PERMEI, REPCORP, RELATÓRIOS SITUAÇÃO) com base em elementos provenientes da P.I.D.E./D.G.S., da L.P. e dos meios de Comunicação Social nacionais e estrangeiros.

Podemos acrescentar que num dos projectos saídos da pena do O.T./C.I., o Projecto da directiva nacional nº01/72 – Guerra psicológica – ano de 1972, aprovado em 15 de Fevereiro desse ano por Marcelo Caetano, se pode ler: «em guerra psicológica só interessam acções maciças com planeamento convergente, a longo prazo, e execução permanente, contínua e persistente. Assim, seria lógico que as acções centralizadas do C.I. pudessem dispor de num mínimo de cento e cinquenta a duzentos mil contos…» Só! Para guerra psicológica. A guerra do tem. Cor. Ferreira da Cunha, actualmente secretário de Estado da Informação do VI Governo provisório. As voltas que o mundo dá! Ou a coerência oculta de certas nomeações…

Passamos a citar certas passagens do artigo do jornal «O Século».

«Tinha nesta altura o C.D.I. por missão o esclarecimento, a propaganda e a acção psicológica com dois objectivos e duas ideias-força fundamentais: prestigio das forças armadas, da Ordem e das instituições, politicas de defesa do Ultramar. Em1971 a Propaganda Psicológica do regime fascista estabelecia que a propaganda se deveria desenvolver através dos meios de difusão legais (TV, rádio, jornais, cinema e outros), e clandestinos como C.D.I. e a D.G.S.

«Os objectivos claros desta política tinham por fim apoiar o Governo fascista na sua intenção de conduzir a defesa psicológica da sociedade portuguesa, exercendo um esforço coordenado com todos os meios e organismos disponíveis, no sentido de garantir os grandes objectivos nacionais, facilitando ao Governo a sua realização.

«A contra-propaganda devia ter uma finalidade: contrabater o pacifismo, defendendo o «ideal» de «luta pela paz», ou seja, a guerra do Ultramar, seria uma guerra «imposta» do exterior e as forças portuguesas «agredidas» lutavam não por que quisessem a guerra, mas para instaurar a paz».

A título de exemplo, o nosso camarada «O Século» diz-nos que «a contrapropaganda fascista se atacava ao «slogan» «Make love not War» por intermédio do «slogan» «Make war with love»…»

A SUPER-P.I.D.E.

«O trabalho do Centro de Documentação Internacional era o fruto de um laborioso e metódico trabalho de informação e coordenação de outros relatórios. Neste sentido e segundo a mesma fonte «o C.D.I. era uma supe4r-P.I.D.E. pela sua capacidade operativa, pela sua visão conjuntural sobre a situação da sociedade portuguesa».

«Para cúmulos dos cúmulos o tenente da Guarda Nacional Republicana José Alberto Gouveia de Barros ex-responsavel do C.D.I. foi encarregado após o 25 de Abril de extinção do mesmo organismo…Como é lógico este senhor acabou por participar no golpe do 11 de Março tendo sido um dos responsáveis pela segurança de Spínola.

Também o antigo ministro da Educação, Veiga Simão, se encontrou intimamente ligado à formação do Centro de Documentação Internacional. Não é de esquecer que Veiga Simão foi nomeado – após o 25 de Abril – embaixador de Portugal na ONU. Esta nomeação tinha sido feita por Spínola e pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros, desta altura, Mário Soares.

Refere ainda o «Século», o caso de uma mensagem do general Costa Gomes dirigida às Forças Armadas em que as instruções pormenorizadas aos órgãos de Informações emitidas pelo Ministério da Comunicação Social, possuíam um carácter notoriamente manipulador e digno do tipo «lavagem ao cérebro».

O C.D.I. teve durante o fascismo uma ajuda económica extremamente consequente. As verbas encaminhadas para o C.D.I. provinham do Ministério da Educação, do Plano do Fomento e de diversos Ministérios. Em 1972 e em 1973 as verbas fornecidas unicamente pela Junta de Acção Social andava à volta de 1.000 contos por ano. Segundo as averiguações realizadas após o 25 de Abril, tudo leva a crer que as verbas previstas por Marcelo Caetano para o funcionamento da C.D.I. (150 a 200 mil contos) tivessem ultrapassado o previsto.


C.D.I e P.I.D.E. faziam intercâmbio no sector no ensino

Fonte: Diário de Lisboa, 04.11.1975

A somar a uma rede de informadores que o C.D.I. já possuía no I.S.C.E.F. (Instituto Superior das Ciências Económicas e Financeiras), no Liceu Padre António Vieira, no Instituto Superior Técnico e na Faculdade de Medicina, Costa André, o secretário de Estado da Instrução e Cultura, em 1970 ou 1971, pediu á P.I.D.E./D.G.S. uma relação dos estudantes das três Universidades «potencialmente perigosas». Pedido satisfeito, os dados transitaram para o C.D.I.

O nosso colega «O Século» revela ainda que os vigilantes («gorilas») das faculdades passaram a colaborar na detecção de actividades estudantis.

Todas as informações sobre a Universidade eram bem pagas pelo M.E.N. a título de exemplo: José Manuel de Sousa director do C.D.I. faria bom dinheiro com os panfletos dos estudantes progressistas da Universidade, comprando-os a 10 escudos e recebendo por eles o dobro.

Informa ainda «O Século» da existência de um Secretariado de Informação e Propaganda Universitária (S.I.P.U.), orientado por José Luís Pechirra, subsidiado directamente pelo gabinete de Hermano Saraiva. Os Serviços Sociais da Universidade eram a cobertura do S.I.P.U.; a residência Monti Oliveti (destacadamente) um dos centros coordenadores das operações de recolha de propaganda antifascista a circular nos meios estudantis. Depois era dirigida para José Manuel de Sousa, director do C.D.I. O S.I.P.U. chegou mesmo a editar o boletim «Vértice» (cerca de meia dúzia de exemplares vieram a lume).

Continuando a socorrer-nos das informações de «O Século»: por volta do ano de 1969, ao acto da matrícula foi acrescentado o preenchimento de uma ficha destinada ao C.D.I., que servia para manter actualizado o «curriculum político» de cada estudante. Este ficheiro deve ter reunido ao todo cerca de 70.000 fichas de estudantes. Além deste havia um particularmente selectivo que recolhia elementos já existentes nos ficheiros da P.I.D.E.D.G.S., L.P., P.S.P., processos disciplinares, reitorias e outros recolhidos por colaboradores do C.D.I. Estabelecia-se assim o intercambio informativo entre C.D.I. e P.I.D.E./D.G.S.

No arquivo do C.D.I. trabalhava mesmo o agente da ex-P.I.D.E./D.G.S., Bernardino da Cunha Azevedo, responsável nesta organização pelo sector de escutas telefónicas e intercepção postal.

Ganhou tal força e capacidade interventiva a existência do C.D.I. que, não poucas vezes, interferiu na homologação ou não dos corpos gerentes das associações de estudantes e outros organismos associativos.

Caetano de Melo Beirão [11.05.1947]

No livro Folhas Ultras (p.187) contei o assalto à Associação Académica de Coimbra, de 9 de maio de 1947, protagonizado por nacionalistas radicais do grupo de Mensagem. Encontrei agora o testemunho directo do ataque, apresentado por Caetano de Melo Beirão (foto de 1963) pouco dias depois do episódio, ao seu mestre Alfredo Pimenta. Reproduzo-o de seguida:

«Deve saber pelos jornais que começou aqui a agitação comunista. Para neutralizar uma acção deles, fizemos, uns 50 rapazes, um assalto à A. Académica. Nesse assalto, enquanto eu agarrava um indivíduo, um outro, comunista filiado, veio por trás e deu-me uma mocada na nuca. Não me matou por acaso, mas machucou-me um pouco. Furioso com a cobardia, abri a cabeça a um, com o guarda-chuva, que ficou partido. Quis fazer o mesmo ao meu agressor, mas só dei-lhe 3 socos pois agarraram-me. Fui depois fazer um curativo ao hospital e tirar uma radiografia. Felizmente não havia nada. Levei 2 "agrafes", que já me tiraram anteontem, e mais nada. Agora estou bom. Já cicatrizou a ferida; já tirei o penso. Temos, porém, andado em grandes actividades, organizando o contra-ataque à ofensiva comunista.»

Memórias do meio Monárquico [04-02-2011]

Mais um interessante testemunho sobre o meio monárquico dos anos 50-60, por parte de um antigo militante de Jovem Europa.

Em “Império – Nação – Revolução”, no capítulo As Organizações Menores da Direita Radical nos Anos 60, trata da Real União Portuguesa (RUP) e do Movimento da Juventude Monárquica (MJM). Talvez tenha interesse o que escrevo a seguir.

A Causa Monárquica, como é sabido, foi durante muitos anos uma extensão política da União Nacional, Partido Único, a que sucedeu a Acção Nacional Popular, também Partido Único.

A palavra Causa foi escolhida porque excluía no seu significado os Partidos. Tal como União. Ambas as organizações eram anti-partidárias, integrando o movimento político europeu, e não só europeu, de combate aos Partidos Políticos – ao pluripartidarismo – durante o período de entre Guerras: 1918-1939.

Assim, a Causa Monárquica tendia a incluir todos os Monárquicos e a União Nacional todos os Portugueses. Nem uma nem outra conseguiram o intento. A primeira, embora muitos anos influenciada pelos Integralistas – anti-partidários – teve sempre Liberais, favoráveis à existência de Partidos.

As cisões na Causa Monárquica foram várias, a começar pela de parte dos Fundadores do Integralismo Lusitano, que com ela se incompatibilizaram muitos antes do fim da II República caída em 1974.

Sem pormenorizar o tema das cisões, falarei duma que me parece de grande importância no desmantelamento da União Nacional.

Em 1957, surgiu a ideia de um grupo de Monárquicos fazer parte das listas eleitorais daquele Partido Único, mediante certas condições de independência dos elementos Monárquicos. Iam realizar-se as Eleições Legislativas, que como sempre não seriam eleições livres. Este projecto assemelhava-se ao sucedido nas Eleições de 1969, quando surgiu a Ala Liberal.

Verificaram-se desentendimentos. Os Monárquicos não participaram e surgiu um movimento de oposição ao Regime. Como se sabe, até então os Monárquicos tinham sido apoiantes – na sua esmagadora maioria – do Salazarismo.

O principal dirigente deste movimento foi, sem qualquer espécie de dúvida, Francisco de Sousa Tavares. Embora haja outros que sem legitimidade pretendam que tiveram essa qualidade. Oportunismo e vaidade, como é habitual.

As raízes desta posição de 1957 devem ser procuradas noutros acontecimentos anteriores como o Caso Dadrá e Nagar-Aveli, em 1954. Estes são os nomes de dois enclaves da então Índia Portuguesa que foram ocupados pela força pela União Indiana. A reacção nacionalista do Regime e a de certos Monárquicos foi completamente diferente. Esta realidade abriu conflito grave de natureza ideológica e política entre Regime e Monárquicos. Teve efeitos mediatos importantes no apoio que os Realistas deram às Eleições de 1958 para a Presidência da República, em que Humberto Delgado foi Candidato.

Após os acontecimentos de 1954 e de 1957 começaram a verificar-se movimentos de muito mais Monárquicos no sentido da crítica ao Regime. Mas crítica muito débil, com muitos compromissos.

Tudo isto – e muito mais – determinou uma nova oposição clara à II República nas Eleições legislativas de 1969. Os Monárquicos surgiram com a sua lista própria, na contestação evidente ao Salazar-Caetanismo. Desta lista independente faziam parte várias pessoas: desde os que já contestavam em 1954, aos críticos débeis e comprometidos que acima refiro, como Henrique Barrilaro Ruas.

A RUP e o MJM apesar do seu tom radical foram manifestações efémeras que acabaram por se integrar, formal ou informalmente, na Causa Monárquica ou na secessão verificada nesta. Aqueles grupos actuaram muito naturalmente na década de 60, na qual se verificaram dois acontecimentos importantíssimos de contestação ao Salazar-Caetanismo: 1962, lutas académicas que determinaram a intervenção da polícia de choque na Universidade de Lisboa. O então Reitor, Marcello Caetano, demitiu-se em sinal de protesto. Foi em 24 de Março. 1969, crise académica de Coimbra considerada como decisiva na queda do Regime ditatorial, em Abril-Junho.

O Radicalismo Monárquico durante a II República foi sobretudo levado a efeito pelo grupo denominado vulgarmente de Monárquicos Fascistas, gente da geração universitária dos anos 40. Os seus nomes principais foram Amândio César, António José de Brito, Caetano Beirão filho, Carlos Guerra de Oliveira, Carlos Klut de Andrade, Fernando Guedes e alguns mais. Este grupo era também chamado do “Avis”, nome dum café então existente, localizado na Praça dos Restauradores em Lisboa, junto ao edifício Eden, que frequentavam também elementos dos denominados Serviços Secretos da Legião Portuguesa, de que era principal responsável José Manuel Salgado, e por simpatizantes do clube desportivo Sporting Clube de Portugal. Faziam ainda parte da clientela elementos do Jornal Agora.

Para além das publicações afectas a este grupo, que teve como vulto importante Florentino Goulart Nogueira, foi aquele que, em meu entender, fez política radical principalmente. E não a Imprensa Radical de expressão Monárquica. Tenho ainda bem presente os embates de natureza intelectual, dialécticos, com os Monárquicos não Radicais, que eram a esmagadora maioria, ligados à Causa Monárquica ou não.

É muitas vezes referido António José de Brito como o filósofo dos Fascistas Monárquicos, ou Radicais. Penso que não: Brito era demasiadamente dogmático, dogmatismo que lhe vinha muito mais da Política do que da Filosofia. Aliás, personalidade cheia de contradições, bem demonstradas depois de 25 de Abril de 1974 no diálogo, diálogos, que manteve com o Regime nascido naquela data. [Perguntei à minha testemunha um esclarecimento – que ainda não recebi - acerca dessa afirmação, sendo que pelo meu conhecimento e amizade pessoal com o Professor António José de Brito me atreveria a afirmar exactamente o oposto respeito a quase todo o conteúdo dessa afirmação. N.d.R.]

A referida crise de 1957 determinou mediatamente, em momentos diferentes, a defesa do ambiente criado pelas Eleições Presidenciais de 1958.

Dos nomes envolvidos na RUP e no MJM, os principais, que ficaram para os registos Monárquicos, foram Alexandre Bettencourt, António Borges de Carvalho, Augusto Ferreira do Amaral e Luís Coimbra. Todos eles integraram o Partido Popular Monárquico.

Este grupo de jovens foi antecedido por um outro um pouco mais velho: Alberto Moutinho Abranches, Álvaro Ferreira da Silva (Fraião), Fernando Amaro Monteiro e eu próprio.

Podemos considerar os dois grupos de jovens como o primeiro e o segundo, cronologicamente, que assumiram posições oposicionistas enquanto Monárquicos, no quadro da II República.

Os oito nomes indicados, posteriormente, tomaram posições bem diversas, embora mantendo o seu Monarquismo.

Movimento Vanguardista - acerca de uma fotografia [10-12-2010]

Uma corecção do Vítor Luís acerca de uma fotografia do Movimento Vanguardista publicada no livro Império Nação, Revolução.

Aqui vai a imagem que publicaste, mas com data de «1969».
Na realidade foi em Julho de 1970, o mês da morte de Salazar. Aliás, ele faleceu salvo erro, num Domingo, precisamente quando estávamos lá, nesse Curso em Tróia. O dr. Adriano Moreira, um dos oradores convidados, mudou rapidamente o tema da sua intervenção, a propósito, que passou a ser sobre Salazar e o Poder Carismático.
Esta «Tróia» é exactamente a da península frente a Setúbal e a «Caldeira» era uma pequena baía interior, do lado esquerdo da península, não muito distante da zona turística, então ocupada pelos primeiros empreendimentos da Torralta nessa zona. O «Palácio Sottomayor» era tão só um grande «casarão» antigo, construído frente ao rio Sado, numa das pontas da «Caldeira».

Jovem Europa [09-12-2010]

Mais um interessante testemunho por parte de um antigo militante de Jovem Europa.

Cerca de 1965 tive notícias dum Movimento Político dirigido por um belga – Jean Thiriart – o Jovem Europa. Aproximei-me daquele, mas tive sempre dificuldade em entender com nitidez o seu objectivo essencial.

Era de Direita, mas apresentava-se como sendo duma Direita especial, inovadora. Mas parecia-me que tinha qualquer coisa de Poujadismo. Afirmava-se profundamente europeu, o que me agradava. Quanto ao Poujadismo, este pareceu-me sempre inconsistente e populista, portanto destinado a desaparecer em pouco tempo. Um epifenómeno. Já não se estava no período de Entre Guerras! Mesmo com esta convicção permaneci no Jovem Europa. Participei na fundação da Revista da Organização em Portugal, chamada Europa; que não viu a luz do dia, tanto quanto sei [na verdade Europa saiu em número único no ano de 1968 n.d.r.] . Os obstáculos da Censura foram muitos.

Recordo-me bem das minhas conversas com o número dois dos Serviços de Censura de Lisboa, o velho tenente Jorge de Carvalho, penso que um antigo Sidonista, que como autoridade policial teve intervenção no caso célebre do Angola e Metrópole. Aquelas conversas foram o processo de dizer não às nossas intenções.

Abandonei o Jovem Europa quando me apercebi que se pretendia organizar uma milícia.

Eu já tinha lido e relido A Técnica do Golpe de Estado de Malaparte; e, além do mais, tinha na altura sido um dos signatários do Manifesto dos 101. Assim não deveria continuar ligado ao Jovem Europa. Seria incoerente.

O meu relacionamento com a Organização deveu-se inicialmente parecer-me ser esta capaz de ajudar a diminuir o marasmo político, social e económico em que o País vivia. Aqui permaneci também dada a presença de um colega, Armando Costa e Silva, a que me ligavam laços de Cultura, e que foi um dos principais pensadores da Extrema-direita, embora não tivesse escrito quase nada sobre este assunto. Debatemos em longas conversas muitos problemas do tempo.

Jovem Portugal por um militante de Jovem Europa [04-10-2010]

Recebo e publico uma nota sobre o Movimento Jovem Portugal, vinda de uma testemunha directa daqueles tempos: um militante da organização Jovem Europa, autor do nome e emblema (o Doriphorus: símbolo criado por Policleto na sua obra sobre a Harmonia) do Centro de Estudos Sociais Kanon [p.124].

Foto: em 1964, a revista Ordine Nuovo do omónimo grupo neofascista italiano publica uma entrevista com Zarco Moniz Ferreira chefe de Jovem Portugal.

Existe, sem dúvida, muita documentação sobre o Movimento Jovem Portugal. É natural que se seja levado a pensar que a sua importância foi grande em Portugal. Mas a realidade é, na minha opinião, bem diversa. É evidente que teve algumas acções e certa expressão jornalística, atendendo à sua qualidade de movimento político. Todavia, a sua força era débil, e nos próprios anos 60 não conseguiu enfrentar os movimentos de Esquerda que se foram formando. Recordo-me da sua ausência numa violenta acção junto à Faculdade de Ciências de Lisboa. Não esteve presente qualquer elemento do Jovem Portugal. A actuação pertenceu a alguns militantes de Direita que não estavam organizados devidamente.

E quanto a originalidade, a criatividade do Jovem Portugal? Entendo que quase não existiu. Socorreu-se fundamentalmente das Doutrinas Fascista e Nazi, com certas adaptações. Praticava, como em qualquer Fascismo, o culto do chefe; dizia-se nacionalista incondicional, sendo ferozmente anticomunista; defendia um nacional-sindicalismo, preferindo este termo – penso eu – a Corporativismo, por táctica e por influência externa próxima. O Corporativismo em Portugal estava gasto e o Nacional-Sindicalismo era de influência espanhola; José António Primo de Rivera e as JONS (Juventudes Operárias Nacionais Sindicalistas) que o Franquismo sabotou, como em Portugal aconteceu ao Nacional-Sindicalismo de Rolão Preto. Não encontro, assim, autonomia conceptual no Jovem Portugal.

A ideia de um nacionalismo universalista ou ecuménico é uma ideia, como ideia, contraditória. Não passa de uma confusão e entendo que tem a ver com a doutrina de Salazar sobre a integração portuguesa, com os povos de Timor ao Minho, na qual eu penso que nem ele acreditava, pois é abstracta, desligada e mesmo contrária à tradição colonial portuguesa, fundamentalmente militar.

A juntar, outro conceito nebuloso: o tratamento, a abordagem do capital e do capitalismo. Este ou é de Estado ou de Associação, como é sabido. Pretender que aquele seja baseado nos trabalhadores, no nacional-sindicalismo, parece-me utópico; se outras razões não houvessem, havia – e há – a de que um trabalhador, um sindicalista, é sempre um futuro capitalizador, pretende vir a participar do capital. Por outro lado, a ideia implícita da Justiça Social é muito diferente hoje - e já era nos anos 60 – da existente antes da I Guerra Mundial, no tempo em que se levantaram Fascismo e Comunismo, Doutrinas com finalidades semelhantes, totalitárias e de massas.

No princípio do século XX, ser trabalhador era sinónimo de exploração sem remédio: baixo ou baixíssimo poder de compra, descendo até à fome, fome mesmo. Do lado oposto estavam os ricos, os proprietários. Hoje quem detém a propriedade não é necessariamente rico. Há empregados por conta de outrem, que não são proprietários de coisa nenhuma, que têm muitíssimo mais rendimento que proprietários de bens imóveis e mesmo móveis. Foi esta realidade que principalmente enfraqueceu os Partidos Comunistas, que continuam a dizer que são os Partidos dos Trabalhadores, mas não são. Foram. Quero dizer, eles podem continuar a dizer que os seus apoiantes são os trabalhadores, mas isto é uma questão semântica: o mesmo que dizer que alguém é fidalgo ou nobre hoje, e dizê-lo no século XIX, sem falar no XVIII. Claro que os Partidos Comunistas e Neofascistas até podem voltar a ter peso, mas com um conteúdo bem diferente. Terão que prometer resolver problemas novos, porque os antigos já estão muitos, resolvidos.

Para completar o ideário do Jovem Portugal o racismo surgiu: lá estão as referências bem conhecidas em relação a judeus e gente de cor, eufemismo de pretos. Isto foram buscar ao Nazismo principalmente. O Jovem Portugal muito fiel à Filosofia onde foi inspirar-se afirmava a negação do indivíduo em favor do grupo, muito naturalmente. Havia muita estratégia e táctica que alguns dos próprios militantes sabiam que não levaria a lado nenhum. Só lhes faltou confessarem-se Nacionais Socialistas, uma vez que a raiz era afim. Mas seria demais! A Alemanha era a Alemanha, com o grupo Spartakista, com Rosa Luxemburgo, que foi origem do Partido Comunista alemão, que os Nazis tiveram que combater rijamente para juntar à sua volta a classe operária mais do que destruir as estruturas sociais.

E deste modo o Movimento Jovem Portugal acabou confundido e subordinado às instituições dependentes do Governo de Salazar, como a Legião Portuguesa. O Fascismo ou Nazismo nunca se teriam levantado sem a ligação ao Capitalismo do primeiro quartel do século XX.

John Andrade [23-08-2010] - II

Mais umas valiosas memórias de John Andrade acerca da Legião Portuguesa.

Sobre a Legião Portuguesa: a partir do momento em que Marcello Caetano subiu ao poder, a LP, que estava em decadência, começou a reorganizar-se, aceitando antigos combatentes do Ultramar (em especial Comandos e Rangers) e alguns voluntários estrangeiros para construir uma frente de oposição a Marcello, que já há anos era considerado de pouca confiança; e Marcello sabia disto, de tal modo que tentou acabar com a LP, mas sem o conseguir. Por outro lado, o Serviço de Informação da LP tinha à frente um holandês, o Engenheiro Gijsbert Andringa, que se suspeitava que fosse Marcellista e tinha uma filha comunista, a Diana Andringa; e o subchefe era o Major Antunes, pai do famoso Melo Antunes, bem conhecido por ligações à esquerda activa e com ficha na PIDE. Em resumo, o SI estava infiltrado indirectamente, e ainda por cima estava sob a vigilância da PIDE, por ordem directa de Marcello.

Alguns Comandos Distritais da LP eram pouco activos, o que levou a facção nacionalista revolucionária a tomar iniciativas que os Comandantes, geralmente oficiais do Exército, desconheciam. Acontecia também que essa facção da LP tinha o apoio da 2ª Repartição (Informações) do Exército. Chegou-se ao ponto de haver uma rivalidade aberta entre a LP e a PIDE para ver quem enviava ao Governo as melhores informações com maior rapidez. E embora a PIDE tivesse uma rede estabelecida de informadores, a LP tinha informações de melhor qualidade; ainda me lembro de ter lido vários PERINTREPS e SITREPS, que realmente estavam feitos com profissionalismo.

No quartel general da LP, na Penha de França, havia antes do 25 de Abril uma colecção extraordinária de relatórios de agentes secretos do tempo da 2ª guerra mundial. O Governo português era neutro, a Inglaterra era a "velha aliada", mas havia muita gente a favor do Eixo. Lisboa era, naqueles anos, uma cidade onde se encontrava um espião em cada canto. A PVDE (antecessora da PIDE) vigiava os agentes alemães e italianos. E a LP simpatizava com eles e trocava informações – e de que maneira; tráfego marítimo, por exemplo. Estava tudo naquelas pastas. Infelizmente, parece que, na altura do 25 de Abril, foi tudo destruído ou deitado para o lixo. Uma perda inestimável.

John Andrade [16-08-2010] - I

John Andrade - autor, entre outras obras, do Dicionário do 25 de Abril - enviou-me este interessante testemunho sobre Coimbra na crise académica de 1969. Publico-o com todo o gosto e espero que este nosso contacto possa tornar-se cada vez mais produtivo em termos de investigação histórica.

Comprei hoje o seu livro Império, Nação, Revolução, que li com muita atenção, por ter vivido a Crise de 69 na Universidade de Coimbra, altura em que coleccionei quantos prospectos encontrei e tirei notas abundantes.

Só me posso pronunciar sobre a parte que diz respeito a Coimbra, e cuja leitura, aliás, me agradou imenso. Mas haveria alguns reparos a fazer. Dois exemplos: na p. 289, seria útil acrescentar que o Comité de Caça aos Comunistas foi criado em Lisboa, onde actuou sobretudo, estendendo-se mais tarde a Coimbra, onde se aliou à ANSA; e na p. 359, confirmo que as folhas intituladas Crónica de uma Vaca Espanhola eram realmente produzidas pela ANSA. Ao que parece, a ANSA começou como um simples projecto de guerra psicológica, mas depressa ganhou vida própria. Creio que teve realmente um papel decisivo na demissão do Gouveia Monteiro. E sabe que tinha contactos com certos movimentos europeus, como a CEDADE em Espanha, e com individualidades como Giorgio Almirante. Outro pormenor: creio que não utilizou as actas do Senado Universitário e dos Conselhos das Faculdades, que têm dados importantes sobre a génese e evolução da Crise de 69. E não mencionou, por exemplo, a filiação confirmada do Reitor Gouveia Monteiro no PCP, nem o José Barros Moura, controleiro do mesmo partido, nem a grande oposição das direitas revolucionárias a José Miguel Júdice, acusado de ser "burguês" e de ter a preocupação de não desagradar ao regime de Marcello Caetano. A razão principal para os ataques dos nacionalistas revolucionários ao Júdice era esta: não confiavam nele. Acusavam-no mesmo de colaborar com as autoridades na perseguição à ANSA, FRA, CCC, etc. – entre outras razões porque ele chegou um dia a dizer, na Cidadela, que "aqueles extremistas só nos causam problemas".

Não fala, no seu livro, da constituição de um Conselho de Veteranos paralelo, que chegou a emitir alguns Decretos. Dizia-se na altura, mas creio que sem fundamento, que o Dux Veteranorum à frente deste Conselho era o veterano de Direito Luís Miranda Pereira, que depois foi Director Geral dos Serviços Prisionais, já em plena democracia.

Embora se refira a agressões a raparigas universitárias e ao facto de o Movimento Estudantil (ME) negar a sua responsabilidade, esqueceu-se de mencionar que foram estas agressões que levaram ao desmantelamento do ME. Eu explico: por ordem directa de Marcello Caetano, a PIDE estava impedida de actuar contra os militantes do ME, que só podiam ser detidos pela PSP, em casos de violação da ordem pública ou delitos menores, ou pela Polícia Judiciária (PJ), em casos de matéria criminal. Ora aconteceu que uma das universitárias agredidas em suas casas era uma filha do Inspector Tinoco, da PIDE, que tomou o assunto nas suas mãos e colaborou com a PJ na identificação e captura dos militantes do ME responsáveis. A partir deste momento, a repressão da PJ passou a ser um facto, aliás contra a vontade de Marcello Caetano, e o ME, que até então tinha gozado de bastante impunidade, viu-se muito limitado nas suas actividades. Quando o Reitor Gouveia Monteiro se demitiu e foi substituído pelo Prof. Doutor Cotelo Neiva, o ME estava pràticamente desactivado, e até ao 25 de Abril nunca mais causou problemas.

Quanto ao Reitor Gouveia Monteiro, já tinha tentado demitir-se antes do incidente do Teatro Gil Vicente, mas o seu pedido foi indeferido pelo Ministro da Educação, Veiga Simão (que, como ele próprio veio a confessar, estava no Governo de Marcello Caetano para o minar por dentro). A sua demissão foi finalmente aceite, não por causa do incidente acima referido, mas pela crescente oposição dos professores e Directores das Faculdades à sua actuação, e também por estar à beira de uma crise de nervos.

Pedro Mesquitela - II [28-05-2010]

Recebo e publico algumas notas de Pedro Mesquitela, protagonista - ele e a sua família - de páginas importantes da luta integracionista pelo então Ultramar português.

Foi um período muito interessante, pois nem sempre as pessoas estavam directamente ligadas a partidos, e muitos iam apenas pelo feeling e sem coordenação alguma, participando só de grupos restritos aos amigos.

Poucos foram realmente influentes como pensadores ou idealizadores, e, eu mesmo, nunca fui ligado a nenhum partido ou facção política, tendo sempre pautado as minhas acções pelo que me parecia correcto e não porque seguisse ordens de ninguém. Fui mais prático do que teórico, embora tivesse estudado toda a teoria. Conheci pessoalmente a maior parte dos nomes que cita a respeito de Coimbra, e concordo que eles tinham um maior embasamento político como grupo. Lisboa sempre foi mais "generalista ".

De certa forma fui o contrário do Luís Fernandes. Ele era o teórico, mas só conheceu a prática no exército. Eu era o prático que no exército foi CCC (graduado em comandante de companhia) mas trazia a bagagem de ter nascido no meio da política e conhecer bem os atores, tanto na Metrópole como no Ultramar. E tinha uma experiência prévia de comando.

As únicas vezes que me consenti pertencer a algum grupo foram os escoteiros em Lourenço Marques e, claro, a Mocidade Portuguesa. Depois conheci o Luís Fernandes (creio que através do António Maria Zorro e o António Couto Viana) e passámos a militar juntos em algumas acções inclusivamente na Legião Portuguesa. Foi ele que me levou para lá e tivemos boas discussões internas no grupo de combate a que pertencíamos com teóricos "marcelistas" tipo Casal Ribeiro .
E nós estávamos certos, o que não ajudou em nada pós 25 de Abril, a não ser prisão ou confinamento domiciliar e seguidas idas á Comissão de Extinção da Legião Portuguesa (leia-se MFA).

Acredite que hoje sou muito mais liberal, talvez até porque não sofro pressões de nenhum tipo e não tenho que reagir com a mesma intensidade e em sinal contrário. Mas não acredito em nenhum político nem faço política no sentido lato da palavra. Acompanho como espectador atento, tiro as minhas conclusões, comparo minhas opiniões no passado com o futuro, e fico feliz quando acerto o diagnóstico. E fico triste com a "baixa política" existente hoje em Portugal.

Que saudades da Librerie de L'Amitié em Paris ....e, de certa forma, da Nouvelle Ordre e dos seus ideólogos. Ao menos existia uma ideologia pela qual viver e lutar. Hoje não sei se realmente existe, até porque o mundo está muito diferente e o bipolarismo acabou (felizmente nesse ponto). Mas falta ainda a "Terceira Via " que nem sabemos ainda realmente o que é.

Vi muito, ouvi muito, vivi muito até porque os Pais e irmãos estavam em Moçambique e eu era o único em Lisboa na Faculdade de Direito. Tinha assim acesso aos 2 lados da realidade portuguesa - a da Metrópole e a do Ultramar, a dos civis e a dos militares, a dos políticos de "esquerda"e de "direita". Triste foi ver como a população da Metrópole em geral conhecia mal a realidade Portuguesa. E disso se aproveitaram muitos, sem escrúpulos nem cor política.

Isso não significa que eu não aprove um Portugal mais Europeu. Também acreditei que as Províncias deveriam ter sua independência, mas não gostei da forma como foi feito, com total desrespeito aos portugueses de lá e até animosidade na Metrópole em relação aos chamados "retornados ". E, sobretudo, o posicionamento dos 2 primeiros governos pós 25 de Abril em relação aos cidadãos, tanto em Portugal como no estrangeiro (consulados). Sou testemunha viva disso, pois saí de Portugal em Agosto de 1975 e só pude voltar em 1988 (quando consegui uma amnistia pela visita do Papa), que acabou com a minha ordem de captura em Portugal. E tive irmãos considerados apátridas pelo Governo Português só porque tinham nascido em Moçambique...Mas tinham bilhetes de identidade e passaportes dizendo República Portuguesa, e não conheceram nunca outra bandeira na vida que não fosse a nossa.

Vejo hoje mais as coisas sob o ponto de vista humano do que político.

Pedro Mesquitela

Pedro Mesquitela - I [28-05-2010]

Recebo e publico algumas notas de Pedro Mesquitela, protagonista - ele e a sua família - de páginas importantes da luta integracionista pelo então Ultramar português.

[Na] reunião na Quinta das Lágrimas, em Coimbra em 1970, após incidentes no Teatro Gil Vicente, […] discursaram vários integrantes das chamadas "direitas" inclusive ex-ministros de Salazar (Franco Nogueira), de que resultaram realmente vários artigos contra o regime "liberal" do Marcelo Caetano. O Luís Fernandes deve ter ainda cópia do artigo que na altura escrevi no jornal que ambos patrocinávamos chamado "Acuso". Muita pretensão minha ...

Devemos ainda falar de gente que naquela altura foi realmente importante como o Jaime Nogueira Pinto, o Luís Fernandes e o Pedro Pinto (em Lisboa) e nos movimentos nas faculdades em Lisboa em 1970 (Jorge Braga de Macedo, Marcelo Rebello de Sousa, eu mesmo, e tantos outros, que já demonstrava o que seria o pré e o pós 25 de Abril.) E os movimentos dentro do próprio governo de Marcelo Caetano com gente como o Baltazar Rebello de Sousa, o Silva Cunha (antigo ministro do Ultramar), O João Rosa (ex-ministro das Finanças) cada qual com a sua agenda e propósito.

[…] meu Pai escreveu vários livros sobre a posição a respeito do Ultramar e fez várias intervenções na Assembleia onde era deputado por Moçambique , e até 7 volumes sobre a História de Portugal em Macau e Extremo-Oriente . Mas fazem parte de um quadro mais vasto, e só posso adiantar que as chamadas "direitas" não eram exactamente monolíticas, tendo várias vertentes, sobretudo no que respeita á política Ultramarina. Desde 1952, quando o Prof. Adriano Moreira foi Ministro das Colónias existiam vários movimentos e matizes quanto á auto-determinação, independência ou simples abandono do Ultramar. Expoentes eram o próprio Prof. Adriano Moreira (que criou o ICSPU), o meu Pai, o Jorge jardim, o Santos e Castro (governador em Angola), o Pimentel dos Santos (governador em Moçambique) entre outros.
Cada qual á sua maneira e com uma visão pessoal do futuro, embora pudessem diferir nos meios para se alcançarem os fins. E todos poderiam ser chamados de "direitas". Mas "direitas" em relação a quê? Onde estava o centro em 1970? Enfim, daria para conversarmos anos a fio.

O Ultramar era a grande questão em Portugal, talvez porque era filho de uma visão de ditadura ou de democracia. Sobretudo a partir de 1970 a questão fica mais aparente, com o Marcelo Caetano e sua indecisão íntima, a traição ao Integralismo Lusitano de que tinha sido artífice, a traição aos ideais "fascistas" como Comissário Nacional da Mocidade Portuguesa, e a enorme falta de capacidade de substituir o movimento aglutinador da antiga União Nacional pela amorfa ANP. Mas não quero ainda entrar nessa questão. É só um "aperitivo ".

José Valle de Figueiredo em África

Publico uma rectificação historiográfica que me fui enviada por um protagonista bem informado do meio nacionalista português.

Depois de ter enviado o comentário anterior, verifiquei que o que tinha escrito sobre o Zé Vale de Figueiredo não estava correcto. A memória às vezes prega-nos partidas.
A correcção é a seguinte: O Zé Vale (Alferes Miliciano de Infantaria) ofereceu-se como voluntário para a Guiné em 1967, para onde foi em rendição individual. Era Comandante Chefe o General Arnaldo Schultz. Spínola só chega à Guiné em 1968.

Corrigido este meu lapso não quero deixar de dizer que de entre todos os "nacionais" não houve nenhum que se escusasse a ir para os Teatros de Operações, uns voluntários e outros logo mobilizados, sem hipóteses de tempo para se voluntarizarem.
Também é certo que alguns Camaradas mobilizados para Províncias não em guerra (Timor e Cabo Verde) trocaram as suas mobilizações de forma a poderem ir para os teatros de operações

José Carlos

Zarco Moniz Ferreira

Aproveito dois comentários às memórias do Professor António José de Brito, para abrir um post sobre o Zarco Moniz Ferreira, líder do Movimento Jovem Portugal e um dos mais importantes animadores da area nacional-revolucionária portuguesa dos anos 60 e 70.
Todos os testemunhos (e muitos há por sí) sobre este militante politico serão bem vindos.

Talvez seja importante acrescentar um detalhe sobre a ida para Angola do Zarco.
Nos anos de guerra os Alferes Milicianos que não tivessem sido mobilizados para o Ultramar no seu tempo de serviço militar obrigatório, poderiam ser chamados para frequentarem o Curso de Capitão Miliciano (Zarco fê-lo em Mafra) já depois de terem iniciado as suas carreiras de trabalho e constituído as suas famílias. Esclarece-se que o poder não significava obrigatoriamente que o fossem.
Zarco viu-se assim confrontado com uma mobilização já com a vida familiar e profissional organizada (ao contrário da generalidade dos que iam como Alferes Milicianos) e também com a ideia que o tinham mobilizado para acabarem com a sua actividade política.
Protestou muito, mas foi. Comandou uma Companhia como Capitão Miliciano e portou-se bem, como aliás era de esperar.
É mais um esclarecimento. Se importante ou não, não me interessa.
Quanto ao Zé Vale foi para a Guiné para o Gabinete do Spínola. Nada mais me apetece escrever!!!
Nota: Zarco foi enterrado transportando nas suas mãos o boné - imortalizado na Guerra da Argélia - que o acompanhou na sua Missão ao serviço da Pátria! Honra lhe seja!

José Carlos


O Zarco enfrentava-os! Recordo-me de o ter visitado no Banco, onde trabalhava, na rua Castilho e lhe ter perguntado como lidara com os vermelhos bancários que certamente tentaram invadir o seu gabinete.
Respondeu: "Com isto!" e pôs de cima da secretária uma granada de mão ofensiva que retirou da gaveta, e acrescentou "Nunca mais ninguém passou daquela porta."

JM Santos Costa

Professor António José de Brito - I [20.04.2010]

Recebo e publico, em dois post e com todo o gosto, os comentários ao livro que me foram enviados pelo Professor António José de Brito, cujo conhecimento do tema e disponibilidade em me o transmitir, foram pedras angulares das minhas investigações.

Em primeiro lugar, quero agradecer-lhe a dedicatória, tão amavelmente exagerada, que me penhorou. Agradeço, também, as múltiplas referências que me faz ao longo dos dois volumes. Muito e muito obrigado.
Já sabe que a minha impressão sobre a obra é em extremos favorável, o que não impede uma ou outra discordância.
Julgo que na expectativa de uma segunda edição que muito desejo tenha lugar, convém fazer algumas rectificações, em pontos que passo a apontar.

Começo pelo Império, Nação, Revolução. Há nele uma investigação exaustiva que merece ser destacada. Até me deu novidades, como a existência de um artigo do José Valle de Figueiredo sobre o “Destino do Nacionalismo Português”.

Claro que não vi sem melancolia perpassarem pelos meus olhos os nomes de uma série de renegados […] que se integraram no presente e abjecto regime.

Pequenos reparos vou apresentar.

A p. 16 o Caetano de Mello Beirão é apresentado como secretário particular do Lumbralles. Era secretário, em lugar previsto na lei.

Giano Accame surge como presidente do Centro di Vita Italiana (p. 68). Se me não falha a memória, o presidente era Ernesto de Marzio, o vice-presidente N. Cimino (espero não estar a deturpar os nomes) e Accame o secretário.

O José Valle de Figueiredo e o Zarco Moniz Ferreira são apresentados como voluntários de guerra de defesa do Ultramar. Do José Valle a esse respeito não sei nada. Em compensação, o Zarco nada teve de voluntário. Andou a protestar, veementemente, contra a sua ida. Foi pelos cabelos mas, honra lhe seja, depois comportou-se bem.

A p. 196 alude-se à direcção do “Agora” por Goulart Nogueira. Talvez não fosse mau esclarecer que se tratava de uma direcção de facto, pois de direito a direcção pertenceu sempre ao Carvalho Branco.

Que a Introdução do Júdice à antologia sobre, ou melhor, de textos de José António Primo de Rivera fosse leitura de referência para os nacionalistas revolucionários (p. 259) é discutível. Alguns ficaram bastante escandalizados com ela. Na Cidadela, do Porto, o Júdice foi recebido com bastantes reticências exactamente por causa da mesma, que aliás despertou a discordância do Rodrigo Emílio, como você adiante refere.

Fala o meu Amigo no “nacionalismo de Estado” de Marcello Caetano (p. 407). Tal nacionalismo se existiu, abandonou-o Marcello, pelo menos, nos anos cinquenta.

E agora uma pergunta. Leo Negrelli, nos tempos de “A Nação” era adido cultural da embaixada italiana? (p. 345)

Professor António José de Brito - II [20.04.2010]

Passemos ao Folhas Ultras.

Creio que a p. 69 há um lapso de relativo vulto.
Escreve você: “na esteira dessa polémica” (em volta do artigo “Toque de Clarim”) “o grupo” dos amigos bracarenses “organiza a primeira conferência em Braga” de Alfredo Pimenta.
Ora, a primeira conferência, nessa cidade, de Alfredo Pimenta teve lugar em 11 de Março, intitulando-se “Mestres do Pensamento”. E o artigo “Toque de Clarim”, como você mesmo o diz apareceu no semanário “Acção”, em 1 de Setembro desse ano.
Impossível claro que tal primeira conferência tivesse qualquer conexão com um artigo que só veio à luz meses depois.

A p. 71 temos o seguinte: “A geração de 70 é constituída pelo grupo de intelectuais que operam entre 1871 e 1888 (nascida oficialmente do grupo dos Vencidos da Vida)”. Acabar em 88 com a actuação da geração de 70 é pelo menos estranho. E que tem o grupo, exclusivamente jantante e mundano, dos Vencidos com a geração de 70?
Houve membros da geração de 70 que nunca foram Vencidos – Teófilo Braga, Adolfo Coelho, Salomão Saragga – e Vencidos que nunca pertenceram a essa geração – Carlos Lobo de Ávila, pelo menos.

A p. 154 leio: “´Queiram Entrar…´ (dedicada às críticas contra o jornal Diário Nacional, órgão da Causa Monárquica que dispensou a colaboração de Alfredo Pimenta”. Não sei se o Diário Nacional era ou, propriamente, órgão da Causa Monárquica, mas não é isso que interessa. O que parece é que o verbo dispensar é o seu tanto equívoco; pode levar a supor que Alfredo Pimenta colaborara anteriormente em tal gazeta. Aliás, no ´Queiram Entrar…´ Pimenta não atacou exclusivamente os dislates monárquicos-democráticos do referido diário. Na secção em causa vemos, por exemplo, uma rude crítica à “Alocução aos Socialistas” de António Sérgio e um protesto contra as palavras de Eva Perón atribuindo a espanhóis a primeira travessia aérea do Atlântico, esquecendo o voo de Gago Coutinho e Sacadura Cabral.

A propósito do que afirma a p. 185 de Salgado Zenha, recordo que este foi nomeado pelo ministro da Educação Nacional, presidente da Comissão Administrativa da Associação Académica e só depois começou a bradar que precisava da eleição dos colegas. Quando ocorreu o episódio de que você fala não tinha recebido a “benção” democrática. Não esquecer que, nessa altura, Zenha era um comunista confesso. Estava algo de podre no reino de Salazar.

Sobre o “factor Pimenta” já disse o que tinha a dizer. Você continua na sua e está no seu direito.

Que em Portugal não tenham surgido grupos como os neo-maurrasianos ou os neo-falangistas (vários) só me parece um favor do céu. A respeito das fantasias emergidas na República Social Italiana (Spampanato, Rolando Ricci, etc) nem é bom falar. Julius Evola já as desvalorizou suficientemente embora ele – que se não considerava um fascista ortodoxo – tivesse igualmente as suas extravagâncias, uma delas bem lastimável que era a aceitação como dogma do chamado holocausto como realidade histórica (isto sem falarmos do seu ódio a Giovanni Gentile, de certo por causas pessoais que ignoro, da sua reverência por Benedetto Croce, e de certas esoterices, e da interpretação que dá ao conceito de Estado Ético).

E a finalizar, repito, a minha apreciação global do seu livro. É, de facto, excelente, o que é óbvio não implica concordância plena com o que nele diz.
Desculpe o desalinhavado desta carta. Renovo os meus agradecimentos.

As saudações de braço ao alto do sempre fascista

António José de Brito

Os desacatos do Teatro Capitólio (Março 1960)

Recebo e publico um interessante testemunho directo de uma pessoa que esteve presente, como espectadora, no Teatro Capitólio, aquando da contestação anti-comunista encetada pelo grupo de Caetano de Melo Beirão e relatada na p.26 do livro. O espírito do blog é mesmo este: estimular a memória dos protagonistas para corrigir a pena do historiador…

[...] notei que na página 26, quando se refere ao incidente que marcou a representação (que não chegou a realizar-se) da peça "A Alma Boa de Setsuan" pela companhia de Maria della Costa a sua informação não está correcta em relação ao que se passou.
Eu tinha 18 anos, tenho ainda muito boa memória, exercitada por 30 anos de [...] leitura sobre História e História de Arte, estava na sala do Teatro onde era suposto realizar-se a representação da peça, e tendo conferido os meus dados com os de outras pessoas presentes também, posso afirmar que o que se passou foi:
O primeiro actor entra em cena e diz: Eu sou Wang, aguadeiro. Imediatamente começou uma incrível barulheira vinda das primeiras filas e a polícia entrou e parou o espectáculo. Os manifestantes sabiam que pela lei portuguesa da época um espectáculo onde há uma desordem é encerrado, e conseguiram o seu fim. A sequência do incidente é que não é exactamente como aparece na página 26 do seu livro. Fomos todos convidados a abandonar a sala e a peça não só não foi representada, como (segundo soubemos depois) a Companhia de Maria della Costa foi acompanhada à fronteira e expulsa de Portugal. Acredito que os manifestantes tenham ido até à polícia (não sei), mas estou certa que foram muito aplaudidos por um Governo que nunca foi contra eles e deve ter agradecido a oportunidade de impedir a representação de uma peça que a censura teria deixado passar por ignorância do conteúdo.